terça-feira, 1 de setembro de 2009

Série: Poemas para Lenir

CORPO


Este desconsolo de ficar
Numa hora insuspeita da noite
Diluído numa sinfonia abstrata
E perante a transitoriedade do amor
Ir buscar no sono distante
A fuga da fuga!


Meu coração se incorpora
À terceira galáxia
E se recusa – violento –
Desprender-se do eterno.

Talvez se memória ajudasse.
Se um corpo de mulher
- um corpo etéreo de mulher –
Surgisse sobre o ombro
Para colher este poema
- uma flor de bronze –
E depois submergisse
Ao contato de outro corpo
- meu corpo perplexo e confuso –
O dia seria uma conjugação possível.

Mas o tempo avança,
Se enrosca aqui e acolá,
Anuncia tornados, isola os amantes,
Sufragando uma noite peremptória
na alma de descuidado vivente.

Na infância aprendi lições de romantismo.
Na idade adulta
Estas lições agora emolduradas
Em velhos casarões
Reúnem-se a incríveis paisagens
Para zombar dos descuidos sentimentais
Que a cada espaço de vida
Desfalecemos
- a vida vira coisa incerta -.

Mas se a memória ajudasse!

Porém o ar retém uma imagem
Que obscura o cérebro,
Conduz a insônias terríveis
E – de surpresa – repousa no travesseiro
Para ternamente dizer de um tempo pretérito
Onde certa vez o amor aconteceu de súbito.


Não.
Não há consolo quando o coração
Pretende fugas ao eterno.

Madrugada começa a busca
De um sucedâneo para a solidão.

Será vão – mas percorremos o quarto vazio:

- Lençóis rebuscados restam
Como testemunho da febre
Que antecede a diluição da entrega –

Só mais tarde,
Muitíssimo mais tarde,
Ocorre de improviso
Ao artista que em pleno palco
Perdeu sua máscara:

O corpo é a um só tempo:

- fogo, miragem, espera.

Frederico Ozanam Drummond

2 comentários:

Anônimo disse...

Os momentos da vida.

Quisera ter permissão para ter um milésimo do momento do outro.Mas parece existir um marcador de hora para dizer da "nossa hora". O que nos reserva além da espera? A essencia do nosso âmago aflorar.Quisera ser o dono da hora e o relógio adiantar. Mas afinal o que nos foi reservado? Entre os caminhos de muitas buscas por me cobrir, descobri, que muito além de mim,cobrirei os outros que tanto me espera.

um amigo

Frederico Drummond disse...

Singular, sem dúvida singular.