sábado, 26 de maio de 2012

NOVA ARAPUCA DA VEJA E GILMAR MENDES DESABA SOBRE SUAS PRÓPRIAS CABEÇAS.

26 de maio de 2012

16h 10
do Estadão
O ex-ministro da Defesa Nelson Jobim negou hoje que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha pressionado o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a adiar o julgamento do mensalão, usando como moeda de troca a CPI do Cachoeira.

Reportagem da revista Veja publicada neste sábado relata um encontro de Lula com Gilmar no escritório de advocacia de Jobim, em Brasília, no qual o ex-presidente teria dito que o julgamento em 2012 é “inconveniente” e oferecido ao ministro proteção na CPI, de maioria governista. Gilmar tem relações estreitas com o senador Demóstenes Torres (sem partido, GO), acusado de envolvimento com a quadrilha do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

“O quê? De forma nenhuma, não se falou nada disso”, reagiu Jobim, questionado peloEstado. “O Lula fez uma visita para mim, o Gilmar estava lá. Não houve conversa sobre o mensalão”, reiterou.
Segundo a revista, Gilmar confirmou o teor dos diálogos e se disse “perplexo” com as “insinuações” do ex-presidente. Lula teria perguntado a ele sobre uma viagem a Berlim, aludindo a boatos sobre um encontro do ministro do STF com Demóstenes da capital alemã, supostamente pago por Cachoeira.

Ele teria manifestado preocupação com o ministro Ricardo Lewandowski, que deve encerrar o voto revisor do mensalão em junho; e adiantado que acionaria o presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência, Sepúlveda Pertence, ligado à ministra do STF Carmen Lúcia, para que ala apoiasse a estratégia de adiar o julgamento para 2013.

Jobim disse, sem entrar em detalhes, que na conversa foram tratadas apenas questões “genéricas”, “institucionais”. E que em nenhum momento Gilmar e o ex-presidente estiveram sozinhos ou falaram na cozinha do escritório, como relatou Veja.

“Tomamos um café na minha sala. O tempo todo foi dentro da minha sala, o Lula saiu antes, durante todo o tempo nós ficamos juntos”, assegurou.
Questionado se o ministro do STF mentiu sobre a conversa, Jobim respondeu: “Não poderia emitir juízo sobre o que o Gilmar fez ou deixou de fazer”.

Procurado pelo Estado, Pertence negou ter sido acionado para que intercedesse junto a Carmen Lúcia: “Não fui procurado e não creio que o ex-presidente Lula pretendesse falar alguma coisa comigo a esse respeito”.

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Gilmar Mendes pede encontro com Lula e depois diz ter sofrido ‘pressão’ do ex-presidente
26/5/2012 16:44, Por Redação – de São Paulo

do Correio do Brasil

O ministro do STF Gilmar Mendes pediu o encontro com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 26 de abril. A reunião ocorreu no escritório do ex-ministro de Lula e ex-integrante do STF Nelson Jobim. Um mês depois, com o andamento da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira, Mendes vai à revista semanal de ultradireita Veja e, em entrevista, afirma que partiu de Lula o pedido para que o Supremo adiasse o julgamento do processo conhecido como ‘mensalão’.

A assessoria do ex-presidente informa que Lula não pretende comentar as declarações de Gilmar Mendes à revista que, por sua vez, também está envolvida com o bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, personagem central de um escândalo que envolve governadores, parlamentares, como o senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), e empresários, liderados por Fernando Cavendish, ex-proprietário da construtora Delta.

A matéria de Veja, divulgada neste sábado apenas na edição impressa, foi repercutida no diário paulistano conservador Folha de S. Paulo e, nela, Mendes afirma que “Lula procurou o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes para tentar adiar o julgamento do mensalão. Em troca da ajuda, Lula ofereceu ao ministro, segundo reportagem da revista Veja publicada neste fim de semana, blindagem na CPMI que investiga as relações do empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com políticos e empresários”.

– Ora, se partiu do ministro o convite para o encontro com Lula, no gabinete do (Nelson) Jobim, é preciso perguntar antes porque o Gilmar Mendes está com tanto medo da CPMI do Cachoeira – afirmou a fonte, ao Correio do Brasil, em condição de anonimato.

Mendes confirmou ao diário paulistano o encontro com Lula, sem dar detalhes, mas disse ter ficado “perplexo com o comportamento e as insinuações despropositadas do presidente Lula”. Ainda segundo a revista, Lula teria dito ao ministro que o julgamento do mensalão seria “inconveniente”. De acordo com a reportagem, Lula teria feito “referências a uma viagem a Berlim em que Mendes se encontrou com o senador Demóstenes Torres”.

Um dos principais envolvidos no processo em curso no STF, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, amigo do ex-presidente Lula, segundo a fonte ouvida pelo CdB, seria o último interessado em adiar o julgamento da questão no Supremo.

– Por mais de uma vez o (José) Dirceu já reafirmou seu interesse em ver encerrada, o quanto antes, essa questão. Segundo os advogados dele, não há qualquer prova de envolvimento do ex-ministro nas irregularidades apontadas no processo – disse.

Ainda segundo a reportagem de Veja, Lula teria procurado, em seguida, o presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, que negou ter havido qualquer contato com o ex-presidente, exceto em um recente almoço no Palácio do Alvorada, na ocasião da instalação da Comissão da Verdade, quando Lula convidou Ayres Britto para um vinho com ele e o amigo comum, Celso Antonio Bandeira de Mello.

– Estive com Lula umas quatro vezes nos últimos nove anos e ele sempre fala de Bandeirinha. Ele nunca me pediu nada e não tenho motivos para acreditar que havia malícia no convite – disse Britto aos jornalistas. Ele acrescentou que a “luz amarela” só acendeu quando Gilmar Mendes contou sobre o encontro, “mas eu imediatamente apaguei, pois Lula sabe que eu não faria algo do tipo”, concluiu.

Fonte:http://www.viomundo.com.br/politica/jobim-desmente-gilmar-e-assessoria-de-lula-diz-que-mendes-pediu-encontro.html

domingo, 20 de maio de 2012

CartaCapital: A Itália já sabia de Cachoeira

Bingo! A Itália Já Sabia do Cachoeira
publicado em 19 de maio de 2012 às 13:52

Em 2004, jornalistas peninsulares falavam das ligações do bicheiro com a máfia

Por Paolo Manzo, na Carta Capital

4 de novembro de 2004. Anotem a data porque foi nesse dia que o nome de Carlinhos Cachoeira se tornou famoso também na Itália. Foi quando a principal revista semanal da península, L’Espresso, publicou uma reportagem primorosa sobre as conexões entre as organizações criminosas italianas que com a globalização se espalharam pelo mundo em busca de países onde lavar o dinheiro do narcotráfico, e de empresários de bingos e caça-níqueis. “Azar de Estado” é o título da matéria assinada pelo repórter investigativo Marco Lillo que, além de descrever as relações suspeitas entre as máfias e os monopólios do Estado no setor das apostas recém-legalizadas na Itália, apresentava Cachoeira como o “chefão das apostas ilegais no Brasil”.

De acordo com Lillo, e também outro jornalista italiano – Francesco Giappichini, que nos informa no seu livro Brasile Terzo Millenio – Cachoeira começou a fazer lobby para a Gtech Corporation, empresa americana líder no mundo das lotéricas, até agosto de 2006, quando foi comprada pela italiana Lottomatica SPA por 4,7 bilhões de dólares. Na época, a Gtech era a responsável pelo sistema informatizado das apostas gerenciadas pela Caixa Econômica Federal e, depois da fusão com a Lottomatica, saiu de Wall Street para passar a coletar dinheiro na Bolsa de Milão. Outra conexão com a Itália.

Cachoeira, escreve Lillo, “queria renovar o contrato das lotéricas com a Gtech, operadora do sistema de loterias da Caixa Econômica Federal contratada durante o governo Fernando Henrique Cardoso, por um valor de uns 130 milhões de dólares”.

Com este propósito, contatou Waldomiro Diniz, já presidente da Loterj, a companhia estadual que trata das lotéricas no Rio de Janeiro e já assessor do então ministro da Casa Civil José Dirceu. O “sonho”de Cachoeira, acrescenta Giapichini, era “a conquista do mercado das apostas online”, que valem bilhões, “começando por Goiás, sua terra natal. Na década de 70, Carlinhos conseguiu estender suas atividades a Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio”.

A página 61 do livro traz o trecho mais interessante: “Na sua ascensão, Cachoeira chega finalmente a definir uma estratégia conjunta com a Gtech” e “quem abençoou o acordo entre ele e a multinacional americana foi mesmo Diniz”. Informações do Ministério Público Federal confirmam os textos dos jornalistas italianos, bem como a CPI dos Bingos.

O acordo entre Cachoeira e a Gtech foi acertado “no hotel Blue Tree, em Brasília”, no começo de 2003, enquanto Waldomiro Diniz “ajudaria na renovação do contrato da Gtech com a Caixa”. Não há dúvida de que o governo Lula criou obstáculos à atuação da dupla “Gtech-Cachoeira” – primeiro o governo vetou o decreto dos bingos e depois rompeu o contrato da multinacional com a Caixa em 2005. E é certo que ao então senador tucano Antero Paes de Barros Neto, natural de Cuiabá, Carlinhos entregou o vídeo provando a corrupção que o envolvia com Diniz.

É certo também o fato de que, em fevereiro de 2004, o semanário Época publicou o conteúdo daquele vídeo depois que Paes de Barros o entregou ao Ministério Público Federal, provocando o que a mídia local batizou como “o primeiro escândalo do governo Lula”. Provavelmente casual, mas com certeza macabro, enfim, é o fato de que Luiz França de Moura Neto, o primo do político mato-grossense, foi encontrado morto, com o rosto e as mãos queimadas, no começo de março de 2004. Certo ainda é que, em menos de dois meses, o mediador Diniz e o “bicheiro” Carlinhos foram condenados pela Justiça carioca, respectivamente, a 12 e 10 anos e meio por corrupção.

A Lottomatica comprou a Gtech em agosto de 2006 e isso, com certeza, é casualidade, mas tem outro fator relevante que interessa ao Brasil e que, uma vez mais, chega da Itália: a lavagem bilionária de dinheiro das máfias italianas em nosso país.

Para indagar sobre o tema, CartaCapital entrou em contato com o atual procurador-geral de Catânia, na Sicília, Giovanni Salvi. Há 14 anos ele era uns dos promotores mais ativos em Roma. Com a coordenação do Departamento de Investigação Antimáfia Italiano (DIA), juntamente com o colega recém-falecido Pietro Saviotti e, graças à colaboração do FBI, Salvi conseguiu documentos probatórios que mostravam como o Brasil havia se transformado na meta preferida dos mafiosos para lavar o dinheiro do tráfico internacional de drogas.

Fácil imaginar o instrumento escolhido para tanto. Os bingos eletrônicos, as máquinas caça-níqueis e, no Panamá e na Argentina, os cassinos. A operação, que na Itália levou em 1998 à prisão de 46 criminosos, passou à história como Operazione Malocchio, ou seja, Mau-Olhado, referência aos Cachoeiras do mundo. “A operação fundou-se sobre o tráfico para a Itália de várias centenas de quilos de cocaína” conta Salvi a CartaCapital. “Na chefia dessa organização estava o foragido romano Fausto Pellegrinetti, que usava o pseudônimo de Franco e trabalhava para Cosa Nostra. O Brasil foi uns dos principais países onde os lucros da droga foram aplicados, através de mediadores da Córsega, principalmente no jogo e nas máquinas caça-níqueis. Nossa fonte principal, Lillo Rosario Lauricella, mafioso de Palermo e braço direito de Pellegrinetti, abandonou nossa proteção e foi morto na Venezuela em 2002”.

Foram 17 milhões de dólares que, em 1997, a dupla Pellegrinetti-Lauricella lavou, comprando e instalando milhares e milhares de máquinas nas salas de bingo brasileiras. O mafioso siciliano Lauricella contatou a empresa ibérica Recreativos Franco por meio de Alejandro Ortiz, um brasileiro que hoje é considerado referência no mercado do jogo ibérico. Pelo menos quatro empresas nacionais entraram em parceria com o até hoje foragido Pellegrinetti, escreve Marco Lillo: a Bmt Brasil Máquinas e Tecnologia Ltda., a Dimares Distribuidora de Máquinas Recreativas Ltda., a Bingo Matic Produtos Eletrônicos Ltda. e a Startec. “Das investigações sobre essa frente”, comenta Salvi, “nada sei. A única coisa que posso dizer é que nós passamos todas as informações às autoridades brasileiras”.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

PARA PRESERVAR A HISTÓRIA DO BRASIL. UM DEPOIMENTO DE DILMA SOBRE TORTURAS. QUE ELA SOFREU.

Da Página do Levante Popular


Cem jovens do Levante Popular da Juventude fizeram o esculhacho do tenente-coronel reformado Maurício Lopes Lima, que foi reconhecido pela presidenta Dilma Roussef como torturador da Operação Bandeirante, no município do Guarujá, no litoral de São Paulo (Rua Tereza Moura, 36), nesta segunda-feira (14/5). Lopes estava no apartamento. Os jovens tocaram o interfone, mas ninguém atendeu.

Em depoimento à Justiça Militar, em 1970, quando tinha 22 anos, Dilma afirmou ter sido ameaçada de novas torturas por dois militares chefiados por Lopes. Ao perguntar-lhes se estavam autorizados pelo Poder Judiciário, recebeu a seguinte resposta: “Você vai ver o que é o juiz lá na Operação Bandeirante” (um dos centros de tortura da ditadura militar).

Maurício Lopes Lima foi apontado pelo Ministério Público Federal (MPF), em ação civil pública ajuizada em novembro de 2010, como um dos responsáveis pela morte ou desaparecimento de seis pessoas e pela tortura de outras 20 nos anos de 1969 e 1970. Segundo o MPF, o militar foi “chefe de equipe de busca e orientador de interrogatórios” da Operação Bandeirante (Oban) e do DOI/Codi (veja destaques).

Lopes nega ter torturado qualquer preso, incluindo a presidenta, mas admite que a tortura era um procedimento comum à repressão. Em entrevista ao jornal A Tribuna, de Santos, em 2010, declarou: “Eu sou uma testemunha da tortura. Sim, eu sou. (…) a tortura, no Brasil, era uma coisa comum (…) da polícia nossa.”
Em entrevista em 2003 ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho, Dilma foi perguntada de quem apanhava quando estava presa e respondeu: “O capitão Maurício sempre aparecia”.

Dilma, que era uma das líderes da VAR-Palmares, foi presa em 16 de janeiro de 1970. Ela foi brutalmente torturada e seviciada, submetida a choques e pau-de-arara durante 22 dias. No depoimento à Justiça Militar, em Juiz de Fora, em 18 de maio, cinco meses depois de ser presa, Dilma deu detalhes da tortura no Dops. “Repete-se que foi torturada física, psíquica e moralmente; que isso de seu durante 22 dias após o dia 16 de janeiro (dia em que foi presa)”, diz trecho do depoimento.

Esculachos em série

O movimento social Levante Popular da Juventude promove mais uma rodada de esculacho de torturadores e agentes da repressão da ditadura em todo o país, nesta segunda-feira (14/5). Os manifestantes apoiam a instalação da Comissão da Verdade, cobram a localização e identificação dos restos mortais de desaparecidos políticos e exigem que os torturadores sejam julgados e punidos.
O jovens condenam a movimentação dos setores conservadores dentro e fora das Forças Armadas, que não aceitam a democracia e não admitem a memória, a verdade e a justiça, desrespeitando a autoridade da presidenta Dilma Rousseff e ministros de Estado, como no manifesto “Alerta à nação”.

Por isso, os jovens saem às ruas para denunciar a impunidade de torturadores e criminosos da ditadura com o objetivo de sensibilizar a sociedade e garantir que a Comissão tenha liberdade para fazer o seu trabalho e alcance seus objetivos.

Os jovens do Levante apoiam a Comissão e lutam para que sejam esclarecidos as graves violações de direitos humanos, como torturas, mortes, desaparecimentos, ocultação de cadáveres. Também querem a identificação dos autores desses crimes e das estruturas estatais e privadas envolvidas nesses crimes.

A partir disso, os jovens apoiam que o relatório da Comissão da Verdade seja encaminhado aos órgãos públicos competentes para auxiliar na localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos, colaborando para a apuração das violações de direitos humanos e fazendo recomendações para a adoção de medidas e políticas públicas para assegurar que não aconteçam novamente.

Abaixo, leia nota do Levante sobre a instalação da Comissão da Verdade:

#Levantecontratortura: Comissão precisa de apoio para alcançar objetivos

A Comissão Nacional da Verdade precisa de apoio e acompanhamento de toda a sociedade, para que venha a cumprir a contento a tarefa que tem pela frente:

- conhecer a verdade sobre os processos de tortura, estupro, morte e desaparecimento forçado dos homens e mulheres que resistiram à Ditadura Militar;
- levar ao conhecimento da sociedade as lutas e a resistência daqueles que enfrentaram a ditadura e os nomes dos agentes do aparelho repressivo e os crimes por eles cometidos;
- fornecer os elementos necessários para que os torturadores, estupradores, homicidas e sequestradores que agiram em nome da ditadura com crime e covardia – e se escondem até hoje – possam ser responsabilizados e punidos, como determinou a Corte Interamericana de Direitos Humanos;

Convidamos a juventude e toda a sociedade para se posicionar em defesa da Comissão Nacional da Verdade, contra as pressões para que seus objetivos não sejam cumpridos ou os resultados desmoralizados, e contra os torturadores, que hoje denunciamos e que vivem escondidos e impunes e seguem ameaçando a liberdade do povo. Até que todos os torturadores sejam julgados, não esqueceremos, nem descansaremos.

Abaixo, leia a entrevista publicada pela Folha de S. Paulo, no 21 de junho de 2005, concedida em 2003 ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho.

Que lembranças a sra. guardou dos tempos de cadeia?

Dilma Rousseff – A prisão é uma coisa em que a gente se encontra com os limites da gente. É isso que às vezes é muito duro. Nos depoimentos, a gente mentia feito doido. Mentia muito, mas muito.
Em um dos seus depoimentos da fase judicial, a sra. denunciou que o capitão Maurício foi ameaçá-la de tortura por estar indignado com as propositais contradições de seus depoimentos.

Dilma – Voltei várias vezes para a Oban, a Operação Bandeirante. Descobriam que uma história não fechava com a outra, e aí voltava. Mas aí eu já era preso velho. Preso velho é um bicho muito difícil de pegar na curva. Preso novo, você não sabe o tamanho da dor.

Como era essa história de mentir diante da tortura?

Dilma – A gente tinha que fazer uma moldura e só se lembrar da moldura, da história que se inventava, e não saía disso. Tinha que ter uma história. Na relação do torturador com o torturado a única coisa que não pode acontecer é você falar “não falo”. Se você falar “não falo”, dali a cinco minutos você pode ser obrigado a falar, porque eles sabem que você tem algo a dizer. Se você falar “não falo”, você diz pra eles o seguinte: “Eu sei o que você quer saber e não te direi”. Aí você entrega a arma pra ele te torturar e te perguntar. Sua história não pode ser “não falo”. Tem que ser uma história e dali para a frente você não sabe mais nada, não pode saber.

Pergunta – É um jogo difícil.

Dilma – É uma arte. A dificuldade é convencê-lo de que você não sabe mais do que aquela moldura. Não é um jogo só de resistência física, é de resistência psíquica. Até porque uma das coisas que você descobre é que você está sozinho.

Quais são as cenas que estão vindo na sua cabeça, agora?

Dilma – Eu lembro de chegar na Operação Bandeirante, presa, no início de 70. Era aquele negócio meio terreno baldio, não tinha nem muro, direito. Eu entrei no pátio da Operação Bandeirante e começaram a gritar “mata!”, “tira a roupa”, “terrorista”, “filha da puta”, “deve ter matado gente”. E lembro também perfeitamente que me botaram numa cela. Muito estranho. Uma porção de mulheres. Tinha uma menina grávida que perguntou meu nome. Eu dei meu nome verdadeiro. Ela disse: “Xi, você está ferrada”. Foi o meu primeiro contato com o esperar. A pior coisa que tem na tortura é esperar, esperar para apanhar. Eu senti ali que a barra era pesada. E foi. Também estou lembrando muito bem do chão do banheiro, do azulejo branco. Porque vai formando crosta de sangue, sujeira, você fica com um cheiro…
Por onde a tortura começou?

Dilma – Palmatória. Levei muita palmatória.

Quem batia?

Dilma – O capitão Maurício sempre aparecia. Ele não era interrogador, era da equipe de busca. Dos que dirigiam, o primeiro era o Homero, o segundo era o Albernaz. O terceiro eu não me lembro o nome. Era um baixinho. Quem comandava era o major Waldir [Coelho], que a gente chamava de major Lingüinha, porque ele falava assim [com língua presa].

Quem torturava?

Dilma – O Albernaz e o substituto dele, que se chamava Tomás. Eu não sei se é nome de guerra. Quem mandava era o Albernaz, quem interrogava era o Albernaz. O Albernaz batia e dava soco. Ele dava muito soco nas pessoas. Ele começava a te interrogar. Se não gostasse das respostas, ele te dava soco. Depois da palmatória, eu fui pro pau-de-arara.

Dá pra relembrar?

Dilma – Mandaram eu tirar a roupa. Eu não tirei, porque a primeira reação é não tirar, pô. Eles me arrancaram a parte de cima e me botaram com o resto no pau-de-arara. Aí começou a prender a circulação. Um outro xingou não sei quem, aí me tiraram a roupa toda. Daí depois me botaram outra vez.

Com choques nas partes genitais, como acontecia?

Dilma – Não. Isso não fizeram. Mas fizeram choque, muito choque, mas muito choque. Eu lembro, nos primeiros dias, que eu tinha uma exaustão física, que eu queria desmaiar, não agüentava mais tanto choque. Eu comecei a ter hemorragia.

Onde eram esses choques?

Dilma – Em tudo quanto é lugar. Nos pés, nas mãos, na parte interna das coxas, nas orelhas. Na cabeça, é um horror. No bico do seio. Botavam uma coisa assim, no bico do seio, era uma coisa que prendia, segurava. Aí cansavam de fazer isso, porque tinha que ter um envoltório, pra enrolar, e largava. Aí você se urina, você se caga todo, você…

Quanto tempo durava uma sessão dessas?

Dilma – Nos primeiros dias, muito tempo. A gente perde a noção. Você não sabe quanto tempo, nem que tempo que é. Sabe por quê? Porque pára, e quando pára não melhora, porque ele fala o seguinte: “Agora você pensa um pouco”. Parava, me retiravam e me jogavam nesse lugar do ladrilho, que era um banheiro, no primeiro andar do DOI-Codi. Com sangue, com tudo. Te largam. Depois, você treme muito, você tem muito frio. Você está nu, né? É muito frio. Aí voltava. Nesse dia foi muito tempo. Teve uma hora que eu estava em posição fetal.

Dá pra pensar em resistir, em não falar?

Dilma – A forma de resistir era dizer comigo mesmo: “Daqui a pouco eu vou contar tudo o que eu sei”. Falava pra mim mesmo. Aí passava um pouquinho. E mais um pouco. E aí você vai indo. Você não pode imaginar que vai durar uma hora, duas. Só pode pensar no daqui a pouco. Não pode pensar na dor.

A sra. agüentou?

Dilma – Eu agüentei. Não disse nem onde eu morava. Não disse quem era o Max [codinome de Carlos Franklin Paixão de Araújo, então seu marido]. Não entreguei o Breno [Carlos Alberto Bueno de Freitas], porque tinha muita dó. Vou dizer uma coisa que uma tupamara, presa com a gente, disse pra mim. A tupamara ficou até com lesão cerebral. Ela disse: “Sabe por que eu não disse, naquele dia, quem era quem? Porque eu era mulher do fulano de tal e queria provar que o uruguaio é tão bom quanto o brasileiro”.

Qual é o significado da frase?

Dilma – Que as razões que levam a gente a não falar são as mais variadas possíveis.

Quais foram as suas?

Dilma – Tinha um menino da ALN que chamava “Mister X”. Eu o vi completamente destruído. Não sei o que foi feito dele. Nunca vou esquecer o quadro em que ele estava. Primeiro, eu não queria que meus companheiros estivessem numa situação daquelas. Segundo, eu tinha medo que algum deles morresse. Terceiro, porque teve um dia que eu tive uma hemorragia muito grande, foi o dia em que eu estive pior. Hemorragia, mesmo, que nem menstruação. Eles tiveram que me levar para o Hospital Central do Exército. Encontrei uma menina da ALN. Ela disse: “Pula um pouco no quarto para a hemorragia não parar e você não ter que voltar”.

Palmatória, pau-de-arara, choque. O que mais?

Dilma – Não comer. O frio. A noite. Eles te botam na sala e falam: “Daqui a duas horas eu volto pra te interrogar”. Ficar esperando a tortura. Tem um nível de dor em que você apaga, em que você não agüenta mais. A dor tem que ser infligida com o controle deles. Ele tem que demonstrar que tem o poder de controlar tua dor.

E o torturado?

Dilma – O jogo é jamais revelar pra ele o que você acha. Ele não pode saber o que você pensa e ele nunca pode achar que você só fala depois de apanhar. Jamais. É melhor você não deixar ele perceber que te tira informação por tortura. Tem que ter uma história. O ruim é quando a sua história rui, por qualquer motivo. Ele acha que você mentiu. Se ele achar que você mentiu, você está roubada. Ele descobriu qual é o jogo. Quando você volta, e é por isso que voltar é ruim, ele diz: “Você mentiu, pô, o negócio é que você mente”.

A sua história caiu?

Dilma – Uma vez caiu tudo, mas aí era tarde demais. Caiu tudinho da Silva. Porque eu dizia que o meu marido tinha seqüestrado o avião e que, se eu não tinha saído com ele, é que eu era uma pessoa que não sabia de nada, que, se soubesse, teria ido junto. Aí eles descobrem que eu era da direção da VAR, e que portanto era impossível não saber do seqüestro. Tava zebrado. Aí tem que falar: “Não, eu era da direção, mas estava separada dele”. Se a sua história cai, você está roubado.

O que é que ajuda, nesses momentos?

Dilma – Se eu tivesse ficado sozinha na cadeia, teria muito mais problemas. Devo grande parte de ter superado, absorvido e em alguns momentos chegado até a ironizar a tortura, para agüentar, às minhas companheiras. Eu lembro do povo do [presídio] Tiradentes, que esteve comigo.

De algum momento em particular?

Dilma – Quando alguma de nós era chamada para o repique, que era voltar à Oban, havia um processo de contágio, de medo, e de uma identificação muito forte entre nós. Como forma de ter controle da situação, a gente dessolenizava. Então, tinha uma variante de grito de guerra. Não mostra que a gente foi heroína, coisíssima nenhuma, e não é nesse sentido. Mas foi a tentativa mais humana de dominar o indizível, que era dizer: “Fulana, não liga não, se você for torturada a gente denuncia”. E ria disso, pela ironia absoluta que é. O que é que adianta denunciar? Para torturado, o que é que adianta? Mas a gente gritava isso na hora que a pessoa estava saindo da cela, como uma forma de manter o nível de controle sob seu destino, que você não tinha. Você não sabia para onde você ia ou para onde a sua companheira ia.

Que balanço a sra. faz da experiência desse período?

Dilma – Não daria certo. A gente fez uma análise errada. Achamos que a ditadura estava em crise, e estava iniciando o “milagre” [econômico]. A gente não percebeu em que condições a atuava. Se a gente tivesse feito uma análise correta da realidade, se tivesse visto o que estava acontecendo… Mas a gente não percebeu, apesar da retórica, qual era o nível de endurecimento político e de repressão que eles iam desenvolver.

O que dizia a retórica?

Dilma – A gente achava que o negócio era uma guerra revolucionária prolongada, ou era um processo de guerrilha urbana, no momento em que o sistema estava em expansão ou ia começar uma baita expansão e o endurecimento pesado. Não se esqueça que no meio de 69 tem a Junta Militar, e daí para a frente você tem talvez o período mais pesado da ditadura, que é o período Médici. É o prende, prende, mata, mata. Numa situação dessas, nós estávamos muito isolados, talvez umas 240 pessoas. O que é que eles fizeram? Eles nos cercaram, desmantelaram, e uma parte mataram. Foi isso que eles fizeram conosco. Eles isolaram a gente e mataram.
E por que se avaliou tão mal?

Dilma – De uma certa forma, a gente tinha um modelo na cabeça. De todo forma, eu acho que a minha geração tem um grande mérito, que é o negócio da Var-Palmares: “Ousar Lutar, Ousar Vencer”. Esse lado de uma certa ousadia. A gente tinha uma imensa generosidade e acreditávamos que era possível fazer um Brasil mais igual. Eu tenho orgulho da minha geração, de a gente ter lutado e de ter participado de todo um sonho de construir um Brasil melhor. Acho que aprendemos muito. Fizemos muita bobagem, mas não é isso que nos caracteriza. O que nós caracteriza é ter ousado querer um país melhor.

Fonte:http://www.conversaafiada.com.br/brasil/2012/05/14/levante-faz-esculacho-do-torturador-da-dilma/

O knockout moral sobre a imprensa, oposição e Gurgel - Do portal "Palavras Diretas"

A oposição míngua e o DEM caminha para a extinção, algumas raposas mais espertas, exibindo lastro pedigree da Arena e PFL, já migraram para o PSD, e de lá, devem continuar exercendo seus posicionamentos mais conservadores e atrasados na política brasileira.


Demóstenes Torres, Marconi Perillo, Leréia, Stepan Necerssian, Roberto Gurgel e Policarpo Júnior unem, no mesmo canto do ringue, acuados pelas revelações das investigaçoes da Polícia Federal: o DEM, PSDB, PPS, Imprensa e Ministério Público.

Todos envolvidos no escândalo do esquema multi milionário do bicheiro Carlinhos Cachoeira.

Todos operando para fornecer "provas" contra adversários e penetrar no poder público em busca de favorecimento dos negócios do contraventor.

Em troca de que?

Os políticos tiveram campanhas abastecidas pelo dinheiro de ilícitos que ajudaram a promover.

A imprensa se promoveu e promoveu os políticos envolvidos, baseados no discurso da ética e dos bons costumes na política,com o nítido intuito de eleger parlamentares e mandatários do executivo que mantivessem o esquema funcionando a todo vapor.

Vendeu mais exemplares denunciando em favor do grupo político-midiático.

A imprensa, da mesma forma, ludibriou a sociedade ao esconder o envolvimento dos políticos denunciados com o contraventor. Ao menos a Veja sabia disso, como provam as centenas de ligações telefônicas entre Cachoeira e Policarpo Júnior, editor chefe da publicação da Abril.

Em outras conversas flagradas, o contraventor indicava em qual parte da revista tal notícia "plantada" deveria ser veiculada.

Neste momento outros órgãos de imprensa partem em socorro da Veja, como O Globo e Folha de São Paulo. Vendo ameaçado seu par, estes dois órgãos de imprensa ignoram os graves indícios contra a revista de Roberto Civita, e, corporativamente, distorcem a realidade para fazer a opinião pública crer que não há conduta que desabone a Veja ou manche as boas práticas do jornalismo.

A troco de que?

Roberto Gurgel, Procurador Geral da Republica, descobre-se agora que evitou que as denúncias contra Demóstenes Torres fossem investigadas em 2009. Logo colaborou para que os ilícitos ganhassem mais volume e ajudou a eleger Demóstenes Torres, Marconi Perillo e Leréia com sua imobilidade desastrosa.

Logo, no mínimo pode-se afirmar que, ajudou a enganar o eleitor do estado de Goiás e a esconder da sociedade fatos tão graves.

A grande imprensa conservadora, despontando as Organizações Globo e Folha de São Paulo, saíram com editoriais e espaços jornalísticos generosos para sua defesa e foram ainda mais longe, tentaram, com a ajuda de Gurgel, mostrar a sociedade que estas acusações contra o Procurador Geral da República, faz parte de uma robusta engrenagem política para inviabilizar o julgamento do mensalão. Ensaio que a própria Veja já havia tentado, sem sucesso, semanas atrás, justamente para fazer "cortina de fumaça" sobre este escândalo de proporções gigantescas.

Gurgel não foi o autor denúncia do mensalão, portanto não seria alvo de movimento parecido com o qual combinou com a imprensa para se safar das acusações.

O Ministério Público não depende tão somente do Procurador Geral da República para denunciar.

O STF acatou as denúncias e irá julgar o mensalão, assim como tem a obrigação e dever cívico, de julgar, com imparcialidade e a salvo de ingerências políticas, os demais graves casos que tenham sob seus cuidados.

Gurgel exagera sua personalidade pública para estar acima da lei, ficar livre de suspeições que sua omissão acarretaram.

A imprensa colabora para reforçar esta imagem supervalorizada de Gurgel, para se safarem das denúncias que apontam para a participação no esquema criminoso.

Com a imprensa nas cordas e sofrendo um golpe atrás do outro, cuidem-se os políticos envolvidos e o senhor Procurador Geral da República pois, nestes casos, costumam oferecer as cabeças de seus comparsas ao sacrifício. Modo operante para sepultar crises que respingam em suas reputações, simplificando ações de quadrilhas complexas na culpa de alguns poucos como algo cabalmente resolvido, esclarecido e sepultado e vida que segue.

Pior: costumam autodenominar-se heróis, porque cobram a autoria de toda e qualquer denúncia e que tudo somente teria vindo a tona e punido graças ao trabalho da imprensa.

Só que neste caso, agiram em conluio como comparsas no esquema de malfeitos que assombra o país e faz com que suas combalidas credibilidades se tornem ainda mais débeis, moral e eticamente.

Fonte: http://www.palavrasdiversas.com/2012/05/o-knockout-moral-sobre-imprensa.html

domingo, 6 de maio de 2012

Como dar sustentabilidade a um modelo - o capitalismo - por definição insustentável? Confira este artigo:

Cebes: Há tempo de evitarmos a barbárie?

Editorial do Cebes, Revista Saúde em Debate - Publicado em 5 de maio de 2012 às 22:42

O mundo ainda tropeça para superar a atual crise financeira que eclodiu nos Estados Unidos em 2008. Por toda a parte ouve-se dizer que é preciso retomar o crescimento econômico dos países desenvolvidos para que a catástrofe não atinja proporções insuperáveis. Grécia, Portugal e Espanha entram em depressão com elevadas taxas de desemprego e cortam programas sociais construídos penosamente após a segunda guerra mundial.

Entre as elites dirigentes e econômicas mundiais avançam as posições conservadoras protecionistas e espalha-se condenação do estado de bem estar social como um dos focos da crise. Medidas de contenção da escalada financeira não conseguem ser implementadas. Os paraísos fiscais e a circulação sem restrições dos capitais continuam desregulados. Os mais ricos conseguem em meio à crise tornarem-se mais ricos. As vozes que discutem e buscam soluções radicais para a crise são abafadas. Ocorre que já se consome hoje o equivalente a uma Terra e meia por ano. A retomada do crescimento nos moldes anteriores manterá o planeta aceleradamente na direção do exaurimento de suas capacidades. Já somos sete bilhões de pessoas e mantido o modelo anterior, duas Terras já serão necessárias em 2030, cinco em 2050.

A concentração de riqueza e poder no mundo e os atuais padrões de consumo que a sustentam é incompatível com o desideratum da sustentabilidade de garantir padrões de “desenvolvimento que atenda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem às suas próprias necessidades”. Vinte por cento da população mundial se apropria de três quartos da riqueza produzida no mundo. Oitenta por cento da população mundial vive com menos de 10 dólares por dia. Metade da “pegada ecológica”, indicador do consumo de biocapacidades planetárias, é impressa por apenas 10 países. As “necessidades presentes” guardam relação direta com esses padrões de consumo. Se fôssemos satisfazer essas “necessidades presentes” igualando o mundo aos padrões dos Estados Unidos, precisaríamos, HOJE, da capacidade de quatro Terras e meia.

Como ainda há 5,6 bilhões de pessoas vivendo em situação de pobreza no mundo é impossível pensar que seremos capazes de atender suas necessidades sem uma mudança radical dos padrões de consumo dos países ricos e das elites dos outros países. Caso isso não ocorra e o crescimento dos países centrais retome o esquema atual vigente caminharemos para uma situação de terrível aumento da iniquidade e para a condenação de contingentes populacionais crescentes à indigência pelo esgotamento da capacidade produtiva de nosso planeta. Às crescentes restrições de livre circulação das pessoas entre os países, cujo exemplo mais ilustrativo é o vergonhoso muro que separa os Estados Unidos do México, corresponderá um aumento radical da segregação das populações pobres e dos conflitos armados no mundo.

A Rio + 20, Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que se aproxima poderá ser uma grande oportunidade de trazermos à tona essas preocupações. Se ela ficar restrita à agenda dos Estados Unidos em torno de uma “Economia Verde” de iniciativas locais de alcance local, que apesar de importantes não tocam no coração dos dilemas atuais de sustentabilidade planetária, estaremos assistindo seu fracasso. É importante dotar às Nações Unidas poderes reais de implementar decisões e cobrar compromissos. O Brasil também deve rever de maneira profunda os padrões de consumo de suas elites que modelam e emulam os padrões de seus novos segmentos sociais em ascensão. Devemos reafirmar nossos compromissos com a saúde e a qualidade de vida equitativa dos povos de todo o mundo. O Brasil, nos dias que correm, tem um protagonismo internacional relevante e deve ocupar a liderança deste processo de mudança. Esperemos que haja tempo de evitar a barbárie.
Fonte: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/cebes-ha-tempo-de-evitarmos-a-barbarie.html

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Maria Inês Nassif e Najla Passos: O que vem aí na CPI

Se partidos aliados ajudarem, imprensa e procurador prestarão contas na CPMI


PT quer investigar organização criminosa e isso inclui envolvimento da Veja no esquema de Carlinhos Cachoeira e o cochilo do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no andamento das investigações da Operação Monte Cassino, da Polícia Federal, concluído em 2009. E governo promete não interferir nos trabalhos para poupar ou para livrar investigados. A reportagem é de Maria Inês Nassif e Najla Passos.

Maria Inês Nassif e Najla Passos, na Carta Maior



Se depender do PT, o jornalista Policarpo Júnior, a revista Veja, a editora Abril e quantos mais profissionais de imprensa comprovadamente tiverem atuado em conjunto com a organização do bicheiro Carlinhos Cachoeira serão chamados, a seu tempo, para depor na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que, nessa semana, começa a revirar o esquema que envolvia o contraventor, o senador Demóstenes Torres (GO-sem partido), o governador Marconi Perillo (PSDB-GO) e outros políticos, e tinha tentáculos em governos estaduais, em obras públicas federais e até no Poder Judiciário.

Não existem, contudo, garantias de que os demais partidos da base parlamentar do governo tomarão o mesmo rumo. E nem a certeza de que os integrantes da comissão resistirão aos holofotes das televisões e a embarcar na agenda que interessa à oposição e aos demais envolvidos no inquérito da PF: concentrar os trabalhos unicamente nas atividades de Cachoeira, Perillo e Torres, e eleger a construtora Delta como única algoz dos crimes cometidos.

Também não deverá ser poupado o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que engavetou, em 2009, os autos da Operação Las Vegas, feita pela Polícia Federal, que já tinha elementos suficientes para justificar juridicamente a investigação do senador Demóstenes e as relações de Cachoeira com diversas instâncias do poder público. “É insustentável o argumento do procurador, de que aguardava o resultado da Operação Monte Carlo, que só começou em 2011”, disse um membro do PT que tem uma posição de destaque na política nacional.

“Este é um caso de aparelhamento da estrutura do Estado pelo crime organizado”, concluiu a fonte. O partido também não tem a intenção de recuar para poupar o governador do DF, Agnelo Queiroz, se for efetivamente comprovada a sua participação no esquema: o que está em jogo vale mais do que um político vindo do PCdoB apenas para disputar a eleição do DF, sem vínculos orgânicos com o PT. E o Palácio do Planalto não pretende mover uma palha para interferir nos trabalhos dos parlamentares – isto quer dizer que qualquer pressão dos envolvidos sobre o Executivo será considerada como um “erro de endereço”.

“O que a CPMI se propõe a investigar é uma rede de negócios montada a partir de tráfico de influência. Seria justo julgar apenas um membro do Legislativo por esses crimes?”, indaga o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA). Por falta de confiança nos aliados, todavia, a ideia é não forçar depoimentos nem acusar culpas “a partir de notícias”. “Essa comissão é diferente das outras: já existe um vasto inquérito feito pela Polícia Federal”, explica Pinheiro. Os fatos fatalmente virão a público, na medida em que os autos do inquérito forem se abrindo aos membros da comissão.

As convocações serão feitas conforme surgirem, de forma a não expor antecipadamente os integrantes da CPMI à pressão dos meios de comunicação. Teoricamente, existiriam condições objetivas para levar com êxito essa estratégia na CPMI: a base governista tem maioria e vários integrantes foram vítimas diretas do esquema de escuta montado por Cachoeira, da ofensiva raivosa do senador Demóstenes Torres, ou de ambos.

Na última semana, por exemplo, o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, não cansava de repetir o seu lado de história para os demais colegas, em plenário, e para integrantes do governo Dilma. Em 2007, em meio a um escândalo que envolvia a sua vida pessoal, Calheiros, então presidente da Câmara, conseguiu reverter, no Senado, uma tendência contrária à sua cassação pelo plenário da Casa. Na véspera da votação, a revista Veja publicou escutas e a versão da ida de um assessor do presidente do Senado a Goiás, para levantar algumas informações de interesse partidário.

A Veja reportou e vendeu a versão de que, na viagem, o objetivo de Francisco Escórcio era colher informações sobre o senador Demóstenes Torres – Renan, segundo a revista, estaria fazendo isso com vários senadores, para chantageá-los em plenário e obrigá-los a votar contra a sua cassação. Vários senadores, que já haviam fechado com Calheiros, mudaram o voto, argumentando que não poderia parecer à opinião pública que estariam se curvando a um esquema de chantagem. Para salvar o mandato, o senador alagoano abriu mão da Presidência do Senado.

Ainda que outros senadores do PMDB tenham razões e ressentimentos contra o esquema Cachoeira – existe a suspeita, por exemplo, de que foi o mesmo esquema de arapongagem do contraventor que provocou o caso Lunus, que acabou com a candidatura de Roseana Sarney à Presidência da República, em 2006 –, os parceiros petistas não confiam inteiramente na disposição de seus pares de comprar uma briga com a imprensa. Existem muitos interesses envolvidos, e essa pode ser uma chance de recomposição desses setores políticos com a mídia tradicional.

De qualquer forma, para o PT a CPMI é a porta de acesso aos autos não apenas da Operação Monte Cassino, objeto dos vazamentos que implicaram Demóstenes e Perillo no esquema Cachoeira, mas na Operação Las Vegas, que foi entregue pela PF ao procurador-geral da República em 2009, e da qual pouco se sabe. Seguramente, as informações dessa operação que antecedeu a Monte Cassino trazem o tamanho da omissão do procurador-geral da República. Ao que tudo indica, o resultado das investigações concluídas em 2009 já davam elementos suficientes para fechar o cerco em torno de Demóstenes e Perillo.

Gurgel, o procurador, no mínimo beneficiou-os com a “cochilada”. Existe potencial para que os autos da primeira operação atinjam um número maior de pessoas, mas Gurgel pode ser um alvo unânime dos parlamentares. “Tem muita gente se perguntando por que o procurador foi tão rápido em processos que os envolviam, e tão lento nos que diziam respeito a Demóstenes”, disse uma fonte do PT. Embora uma vastidão de interesses e ressentimentos seja um potencial mobilizador dessa CPI, a ação de parlamentares aliados, mesmo os da esquerda, relativizam essa possibilidade.

Na semana passada, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) articulava às claras uma solução jurídica para impedir a convocação de jornalistas e empresas de comunicação. Invocou o artigo 207 do Código Penal, que proíbe a tomada de depoimentos das pessoas protegidas por segredo profissional. “Não se chama um padre para depor”, argumentava Teixeira. “Os jornalistas podem alegar essas razões para não depor, mas isso não impede que sejam chamadas”, contrapôs o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), também membro da comissão.

A outra forma de concentrar excessivamente as investigações da CPI na Construtora Delta, do esquema de Cachoeira, foi um acordo feito entre oposição e chamados “independentes” de “seguir o dinheiro”, também uma proposta de Teixeira. As relações do esquema Cachoeira com a Veja, na opinião de parlamentares ouvidos pela Carta Maior não necessariamente envolveram dinheiro, embora obrigatoriamente tenham envolvido tráfico de influência, o que configura crime da mesma forma.