quarta-feira, 25 de abril de 2012

Economist: A terceira revolução industrial

da revista britânica Economist, em 21.04.2012

A digitalização da manufatura vai transformar a forma com que as coisas são feitas — e mudar as políticas de emprego, também

A primeira revolução industrial começou no Reino Unido no fim do século 18, com a mecanização da indústria têxtil. Tarefas feitas laboriosamente pelas mãos, antes, por centenas de tecelãs, foram juntadas em um único moinho de algodão, nascendo assim a indústria. A segunda revolução veio no século 20, quando Henry Ford dominou a linha de montagem móvel e trouxe a idade da produção em massa. As duas primeiras revoluções tornaram as pessoas mais ricas e urbanas. Agora uma terceira revolução está em andamento. A manufatura está se tornando digital. Como o relatório especial desta edição destaca, isso poderia mudar não apenas os negócios, mas muito mais.

Um número de notáveis tecnologias estão convergindo: software engenhoso, novos materiais, robôs mais capazes, novos processos (notadamente a impressão tri-dimensional) e toda uma gama de serviços baseados na rede. A fábrica do passado era baseada na produção de zilhões de produtos idênticos: Ford famosamente disse que os compradores de automóveis poderiam escolher qualquer cor, desde que fosse o preto. Mas o custo de produzir quantidades menores com maior variedade, com cada produto desenhado para atender aos desejos de cada consumidor, está caindo. A fábrica do futuro vai focar na customização em massa — e pode ficar muito mais parecida com aqueles teares individuais do que com a linha de montagem do Ford.

Rumo à terceira dimensão

A velha forma de fazer as coisas envolvia muitas partes, além de parafusos ou solda para juntá-las. Agora um produto pode ser desenhado por um computador e “impresso” numa impressora 3D, que cria um objeto sólido construído através do acúmulo de camadas sucessivas de matéria prima. O design pode ser modificado com apenas alguns toques no mouse. A impressora 3D pode funcionar sem supervisão humana e pode fazer coisas que eram muito complexas para as linhas de montagem tradicionais. Em algum tempo, estas máquinas impressionantes poderão fazer qualquer coisa, em qualquer lugar — da garagem de casa ao vilarejo da África.

As aplicações da impressão em 3D são especialmente intrigantes. Os aparelhos contra a surdez e as peças de alta tecnologia de jatos militares já têm sido impressas de forma customizada. A geografia das cadeias de fornecimento será transformada. Um engenheiro que trabalha no meio de um deserto e sentir falta de alguma ferramenta não precisará encomendar para entrega na cidade mais próxima. Ele pode fazer o download do design e mandar imprimir a ferramenta. Os dias de um projeto paralisado por causa de uma peça ou de um kit, ou de consumidores que reclamam por não encontrar peças de reposição, vão ficar para trás.

Outras mudanças serão tão impressionantes quanto as acima descritas. Os novos materiais são mais leves, mais fortes e mais duráveis que os antigos. A fibra de carbono está substituindo o aço e o alumínio em produtos que vão de aviões a bicicletas. Novas tecnologias permitem a engenheiros criar objetos em pequena escala. A nanotecnologia dá a objetos novas capacidades, como os band-aids que ajudam a cicatrizar cortes, motores mais eficientes e talheres mais fáceis de limpar. Vírus geneticamente modificados estão sendo desenvolvidos para construir baterias. E com a internet permitindo a um número maior de designers o trabalho colaborativo em novos produtos, barreiras estão caindo. Ford precisou de grande quantidade de capital para construir sua fábrica colossal em River Rouge; o equivalente moderno dele pode começar com um simples laptop e a fome de inventar.

Como todas as revoluções, esta vai causar perturbações. A tecnologia digital já balançou as indústrias do varejo e da mídia, da mesma forma que os moinhos de algodão esmagaram os teares manuais e o Modelo T detonou as carroças. Muitas pessoas vão olhar para a fábrica do futuro com arrepios. Elas não serão cheias de máquinas sujas e de homens vestindo macacões oleosos. Muitas serão limpíssimas — e quase desertas. Alguns fabricantes de automóveis já produzem duas vezes mais carros por empregado que uma década atrás. A maior parte dos empregos não será no chão de fábrica, mas nos escritórios por perto, cheios de designers, engenheiros, especialistas em TI, experts em logística, integrantes da equipe de marketing e outros profissionais. Muitas tarefas repetitivas vão se tornar obsoletas: você não precisa mais de rebitadores se o produto não usa rebites.

A revolução vai afetar não apenas como as coisas são feitas, mas onde. As fábricas já se moveram para países de baixos salários para cortar custos. Mas o custo do trabalho está se tornando menos e menos importante: um iPad de primeira geração, de 499 dólares, tinha custo de mão-de-obra de apenas 33 dólares, dos quais a montagem na China representava apenas 8 dólares. A produção no exterior está crescentemente se movendo de volta aos países ricos, não apenas porque os salários na China crescem, mas porque as empresas agora querem ficar mais perto dos consumidores, para responder mais rapidamente às mudanças na demanda. Alguns produtos são tão sofisticados que ajuda juntar por perto os encarregados do design e os da produção. O Boston Consulting Group avalia que em áreas como transporte, computadores, metais e maquinaria, de 10% a 30% dos bens que os Estados Unidos agora importam da China poderão ser feitos em casa até 2020, aumentando o PIB americano em 20 a 55 bilhões de dólares por ano.

O choque do novo

Os consumidores terão pequena dificuldade para se adaptar a essa nova idade de produtos melhores, entregues com mais rapidez. Os governos, no entanto, terão dificuldade. Seu instinto é proteger indústrias e companhias que já existem, não os novatos que pretendem destruí-las. Os governos fazem chover subsídios em fábricas velhas e intimidam os chefes que querem exportar a linha de produção. Gastam bilhões apoiando tecnologias que, acreditam, devem prevalecer. E se apegam à crença romântica de que a manufatura é superior aos serviços e ainda mais às finanças.

Nada disso faz sentido. A fronteira entre manufatura e serviços está se desfazendo. A Rolls Royce já não vende motores de jatos; vende as horas que cada motor passa empurrando aeronaves pelo céu. Os governos sempre foram muito ruins na escolha dos vencedores e isso pode piorar, no momento em que legiões de empreendedores e inventores trocam projetos online, transformam esses projetos em produtos na garagem de casa e os vendem globalmente. Enquanto a revolução avança, os governos deveriam se manter no básico: melhores escolas para uma força de trabalho especializada, regras claras e um campo de disputa nivelado para empresas de todos os tipos. Que deixem o restante para os revolucionários.

PS do Viomundo: Descartando a ode ao capitalismo sem operários, o relatório da revista sobre o assunto impressiona. Este será o primeiro século da Ásia. Quando a África se organizar e se tornar o celeiro do mundo — o que acontece enquanto você lê isso — terá a imensa vantagem de estar logo ali, ao lado dos grandes mercados asiáticos. Indonésia, Vietnã, Tailândia e até mesmo as Filipinas estão a caminho, para se juntar a China, Índia e Japão. Enquanto os jovens japoneses e sul coreanos navegam em altíssimas velocidades, multiplicando exponecialmente em rede o seu potencial, os nossos ficam à mercê da Telefônica, que exporta o lucro obtido no Brasil para tapar o rombo na Espanha. Como já perguntou o economista Márcio Pochmann, mais de uma vez: é Vaco ou Fama? Conhecendo a elite brasileira, desinformada, medíocre e complacente, aposto na Fama.

Fonte:http://www.viomundo.com.br/politica/economista-a-terceira-revolucao-industrial.html

2 comentários:

Anônimo disse...

Creio que uma "nova" forma de acumulação de riqueza, não liquida formas anteriores, uma vez que, as sociedades são desiguias em forma e conteúdo.

Frederico Drummond disse...

1 - Clara que não. A a exploração da mais valia e sua apropriação e acumulação pelo capitalista é da natureza do Capitalismo. E enquanto a correlação de força for desfavorável aos explorados este continuarão se beneficiando apenas das migalhas de novo excedente.
2 - Não podemos esquecer uma lição que está na base na análise marxista: a modernização do capitalismo também caminha junto com a crise do capital financeiro. Ou seja o ponto da exclusão que o capitalismo fortalece sua natureza autofágica: vide quase todos os paises europeus. E ai que pode estar o ponto de mudança da correlação de fortas. E não é apenas o assalariado, mas todos os que sofrem com o "mais-consumo" do planeta, fazendo da questão ecológica a nova seara da luta contra a exploração.